quarta-feira, 15 de agosto de 2012

who knew?




O Felipe pegou a minha mão e a segurou firme e eu fiquei meio desconcertada com o toque frio das suas mãos. Seus dedos são mais longos que os meus e naquele momento aquela diferença pareceu muito maior. Mas o espaço entre os dedos dele eram o espaço ideal para que eu encaixasse os meus. Era o espaço ideal, porque eu não caibo no estreito. Meus desejos são urgentes, eu vivo de extremos, busco encaixes perfeitos, como as nossas mãos. Ele tirou sua carteira de couro preta e pagou pelos dois ingressos. Em situações normais, eu discutiria e insistiria em pagar pela minha entrada, mas seu olhar me manteve calada. Entramos na sala do cinema e eu ainda estava preocupada se eu havia feito a escolha certa para a roupa. Para um primeiro encontro, aquela blusa era demais? Aquela calça aumentava o meu quadril? Deveria ter colocado mais blush? Enquanto eu não falava nada, a minha mente gritava. O Felipe, então, levantou o braço da cadeira e passou o braço ao meu redor. Sussurrou no meu ouvido: Você está linda, Alice. E, naquele momento, a minha mente se calou também. Nós nos beijamos e eu soube que todas as escolhas estavam certas, inclusive ele. 
E o tempo voou. Mas não importa o tempo, né? Tempo não define tamanho, nem intensidade. Pode durar um mês ou pode durar a vida toda, porque cada dia é uma nova surpresa e não dá mais para achar que a gente prevê o dia de amanhã. Que direito eu tenho de dar um murro na cara daqueles que me alertaram que em algum tempo o Felipe iria embora? Nenhum. Quem iria adivinhar? O fato é que a gente não sabe o valor de um momento até que ele seja mera lembrança.
E o tempo voou mais uma vez e deu um jeito em tudo isso. O tempo deu jeito em mim e me fez cultivar vergonha na cara ao invés de expectativas. Deu um jeito em mim, me pegou de jeito. De um jeito que me fez ser como o fogo, que aquece quem precisa e queima quem merece. Mas nem sempre eu sou fogo. O tempo me fez ser gelo. Como dizem por aí, antes eu sofria, mas agora eu sou fria. Fria, porque eu sou feita disso da cabeça aos pés. Mal humorada. Cara fechada. Pavio curto. Medo de amar. Medo de compromisso. Medo de entrega. Descrença nas pessoas.
E, para o desespero do Felipe, eu vou continuar feliz, vou continuar me amando e principalmente, ao menos durante 90% do meu tempo, não dando a mínima para o que ele pensa. E ele vai me olhar, vai me julgar, vai tirar conclusões precipitadas e, ainda assim, não vai saber nada sobre mim. Eu me tornei o que o tempo deixou que eu fosse. Eu chamo todo mundo de amor, assim não preciso me preocupar em gravar nomes para depois em preocupar em esquecê-los.
Mas é em dias como hoje que isso tudo volta a tona e parece que o tempo não fez o seu trabalho direito. O mundo está cheio de incompetentes...
Hoje é um dia agridoce (amo essa palavra), porque eu acordei lembrando de coisas que eu quero esquecer, sorrindo por lágrimas que querem chorar e chorando numa alegria que preenche. Há uma razão para eu ter dito a todas aquelas pessoas que eu estaria feliz sozinha. Não foi porque eu achei que estaria feliz sozinha. Foi porque eu achei que se eu amasse alguém e aí me decepcionasse, eu poderia não me recuperar. É mais fácil estar sozinha. Ao menos 90% do tempo. Minha vida é assim, bem comum. Bem "vivível" durante 90% do meu tempo. O que acontece é que nos 10% remanescentes, é tudo um caos. Nesses dias, minhas lágrimas me acordam.
Coloquei minha maquiagem, disfarcei para ninguém perceber. Sacudi o travesseiro e sorri, porque ninguém precisava saber que eu chorei durante a noite. A última coisa que eu preciso agora são pessoas se metendo na minha vida e opinando nela.
O André passou para me buscar em casa e fomos comer algo na rua. Ele é legal, ele me saca. Ele me deixa falar sobre tudo e não pergunta o que não lhe diz respeito. Eu tenho o meu espaço, um ouvinte integral e que não quer mais nada de mim, além do que eu quero dele: companhia para encarar essa vida. E ele é realmente muito legal. Mas tem dias, como hoje, que nem mesmo o André basta pra resolver a minha vida. É puro lixo. Pura tralha acumulada. 
Hoje, eu fiz o André de psicologo e ele me ouviu desabafar sobre tudo. Só ele sabe as minhas dores e delícias. E o André... O André é um cara inteligente, desses que não se faz mais por aí. "Você o conhece?" ele me perguntou. E aquela pergunta, que parecia ser tão óbvia de ser respondida, me fez viajar dentro da minha cabeça. E eu lembrei do jeito que o Felipe penteia o cabelo, do sorriso dele que tem aquele detalhe que eu adoro e só ele sabe. Eu lembrei daquela mania babaca que ele tem de me fotografar dormindo. Eu lembrei das noites de pizza e filmes de época. Eu lembrei das manias surdas, dos comentários fora de hora e da dificuldade em atribuir valores a um copo de água. E eu sorri. Mas logo em seguida eu lembrei do cara que o Felipe se tornou. Ele mudou o corte de cabelo, parou de sorrir para as fotos, vendeu a câmera, enjoou de pizza e prefere jogar videogame com o irmão mais novo. Ele não demora para responder perguntas, parece sempre saber o que está dizendo e bebe exatamente o tanto de água que precisa para digerir a vida. Meu sorriso logo se desfez em um mísero sussurro: Não mais.
E aquilo doeu, é claro. Doeu muito. Mas ninguém precisava saber, nem mesmo o André. Então eu sorri novamente. 
Acho que a gente se perdeu quando nossas mãos já não se encaixaram. Você me deixou escorrer por entre os seus dedos e esqueceu de apertar firme a minha mão, como aquele primeiro encontro. Como todo o tempo que passamos juntos. Eu saí das suas mãos e hoje estou nas mãos do vento, esperando que ele me leve até a melhor opção e que cuide de mim.
Mas não vou negar que hoje meu nome é saudade, uma saudade que, como diria Caio Fernando Abreu, "faz os olhos brilharem por alguns segundos e um sorriso escapar volta e meia, quando a cabeça insiste em trazer a tona, o que o coração vive tentando deixar para trás". 


* Post inspirado na música Who Knew da Pink ;)

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